terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Brasil e Alemanha: parceiros comerciais e ideológicos


Foto: Ricardo Stuckert. 


Por Adriana do Amaral

Na entrevista coletiva concedida no final da tarde de segunda-feira (30 de janeiro), o chanceler alemão, Olaf Scholz, lavou a alma dos brasileiros que ansiavam e, pelo menos durante os próximos quatro anos,  se libertaram de um governo que flertou com o nazismo no passado recente. Imagino que o político alemão também esteja respirando aliviado.

"Vocês fizeram falta, Lula", soltou o político, quase num desabafo. Uma frase dita no final de uma declaração completa. Fala que significa muito para quem souber associá-la ao vazio internacional protagonizado pelo ex-presidente do Brasil. Também, pela insegurança, instabilidade e perigo vivido.

"Estamos muito felizes pelo Brasil estar de volta à cena mundial e como liderança da América Latina. Bem-vindo de volta, Brasil", soltou em alto e bom tom, sinalizando um novo momento nas relações internacionais entre os dois países. 

Chamou-me a atenção a época em que aconteceu a visita. Três dias após o mundo lembrar o Dia Internacional do Holocausto e no momento em que o Brasil vive um dos seus principais dramas: o genocídio do povo yanomami, numa herança deixada para o presidente Lula resolver. 

Meus colegas alemães

Descobri a importância do Brasil como parceiro oficial da Alemanha ao trabalhar numa empresa de origem familiar alemã, no segmento de bens de capital. Muito da "robusta" tecnologia germânica é produzida no Brasil, nas cidades de São Paulo e Manaus. Os maiores parques fabris, que materializam o "estado da arte da engenharia" embora a empresa tenha filiais em mais de uma centena de países.

Testemunhei como os alemães faziam questão de expressar os seus sentimentos, e como pareciam gostar dos brasileiros. Eram gentis ao se fazerem entender por nós e elogiavam a proatividade e dedicação dos trabalhadores, que não mediam esforços para ajustar as agendas ao câmbio horário da matriz e explicar a complexa política cambial. Foram inúmeros projetos e processos realizados, então. 

Eu, trabalhando na comunicação interna e externa tive a oportunidade de estar ao lado dos CEOs. Presenciei o presidente do grupo carregar no colo o presidente de uma das empresas brasileiras. É claro, a fotografia não foi publicada. 

Confesso que nunca entendi o hábito que eles têm de tomar café com leite após as refeições. Também, foi com eles que aprendi a gostar dos meus dentes desalinhados. Aquelas pessoas riquíssimas e cultas não desgastavam os dentes para colocar lentes de contato, como fazemos aqui. Imperfeitos, porém saudáveis. Dentes fortes são belos.

Num passado não muito remoto, participei ativamente dos longos debates nos escritórios localizados no parque fabril, que reúne quatro empresas do mesmo grupo. Os brasileiros diplomados não poupavam  críticas ao governo popular e eu sempre polemizando em prol da equidade. 

Aliás, minha maior provocação era colocar os "colaboradores" -odeio essa expressão que pretende dar certa elegância aos empregados- do chão de fábrica nas revistas. Inclusive nas internacionais.

Épocas de bonança, quando o dinheiro permitia pequenas extravagância que iam além da "linha branca" e da casa ´popular, mas as críticas já eram muitas, sobretudo no governo da presidenta Dilma Rousseff. Arrisco-me a dizer que, sim, o Brasil parceiro de negócios fez muita falta. E o chanceler sabe muito bem o quanto. 

Não apenas o parceiro de negócios, mas também o Brasil hospitaleiro, onde os companheiros alemãs tomavam caipirinha, iam aos jogos de futebol. Dentre outros passeios, nem tão ecológicos assim, faziam questão de conhecer as Cataratas do Iguaçu.

Aprendi uma única frase em alemão: ich liebe dich. Afinal, o amor está matando o ódio. E o fascismo não é bom nem para brasileiros, nem para alemães.


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