domingo, 26 de fevereiro de 2023

E se nossos antepassados tivessem morrido nas suas jornadas de imigrantes?

Reprodução:
Monumento às Mães Imigrantes, Espanha
Com profunda tristeza leio sobre o naufrágio ocorrido no Sul da Itália onde sucumbiram 47adultos, 11 crianças e um recém-nascido imigrantes. 

Ao ler a matéria num jornal de circulação nacional, originária de Agências de Notícias, percebo o amplo espaço dado às falas dos políticos italianos contrários à migração.

Parece que o problema é com o outro. Nesse caso, pessoas comuns, desimportantes.

Fico pensando: onde estaríamos, a maior parte dos brasileiros, se não fosse a coragem dos nossos antepassados? 

As razões mudam, mas os fluxos migratórios foram marcantes ao longo de toda a história da humanidade. Motivados pela adaptação natural,  cultura dos povos, conflitos locais, grandes guerras, fome à globalização atual, que ao mesmo tempo instiga à migração e provoca a morte dos imigrantes.

A Itália, e a maior parte da Europa, têm definido restrições para a entrada dos imigrantes e políticas duras de detenção e repatriamento. Sabemos que, muitas vezes, sair de seu pais, é a única alternativa de sobrevivência para inúmeras pessoas. O sonho do mundo globalizado é para poucos!

Num contraponto, com alegria, espero os desenrolar dos debates e ações do Grupo de Trabalho sobre Políticas Migratórias, lançado na quinta-feira (23) e subordinado ao Ministério da Justiça. O Brasil deve retomar a vanguarda da acolhida aos imigrantes, com uma Política Nacional Migratória, conforme previsto no Artigo 120 da Lei de Migração. 

Será o retorno do país das fronteiras abertas, com direitos garantidos aos imigrantes e refugiados? Sinceramente, anseio que sim.

Outro dia, ouviu de uma amiga: não devemos receber ninguém que não possa se manter por conta própria. É claro, rebati. 

A cultura e a troca informacional geradas com a convivência com uma pessoa estrangeira é incomensurável. Além disso, os imigrantes e refugiados - e migrantes internos- lutam não apenas pela sobrevivência, mas buscam por dignidade, que também implica em trabalho, geração de renda e participação social.

Os familiares do meu avô paterno vieram "explorar" / colonizar o Brasil, há 500 anos, e aqui ficaram. Os meus bisavós maternos vieram da Itália como opção de vida (compraram terras para se estabelecer como agricultores). Os avós do meu companheiro vieram no Líbano conhecer o novo mundo. 

Eram outros tempos, muitos se perderam no caminho, mas fazemos parte dessa jornada. Acredito que todes nós tenhamos uma história para contar sobre as nossas famílias ou famílias conhecidas.

Tenho amigos de várias origens e etnias, tive colegas de trabalho que vieram para São Paulo como última esperança, como forma de resistência, estudei e estudo com imigrantes. Conversar com cada um deles é testemunhar a dimensão da opção pela vida. Além disso, tornamos nossos os hábitos vindos de terras longínquas na culinária, religião, vestuário, música e até idioma.

Por tudo isso, li com profunda tristeza não apenas a notícia sobre a tragédia humana, mas também a forma burocrática como ela foi redigida. Algo de xenofobia ou racismo nas entrelinhas.

O mundo é grande, mas a janela sobre o mar não cabe mais num espaço de beijar, poeta... Os homens fecharam as janelas, proibiram a navegação, cerraram os olhos para a vida...


A mãe imigrante chora a história interrompida...




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