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Arte: Onézio Cruz |
Tarcísio tenta matar a memória do Patrono da Educação brasileira, Paulo Freire, e para isso ressuscita um bandeirante. Fernão Dias representa o passado presente na mente do governador.
O capitalista de hoje remete à memória do colonizador/explorador de ontem. O herdeiro eleito pelo bolsonarismo retrógrado, mais uma vez, mostra a que veio: para lembrar que da sua mente e martelo o bolsonarismo sobrevive no poder.
O migrante Paulo Freire mudou-se para São Paulo para revolucionar o ensino. O imigrante Fernão Dias veio para São Paulo para a explorar. O migrante governador mudou-se para São Paulo para entrar na política e fazer do Estado "cabide de emprego".
Ele não é daqui, não conhece a cidade nem o Estado, sequer imagina o que Paulo Freire fez enquanto Secretário Municipal da capital paulista. Não conhece o Instituto Paulo Freire, sediado na cidade de São Paulo, e talvez nunca tenha lido um dos seus livros.
Por tudo isso, ele atropela o bom senso? Ou apenas estaria reforçando a que veio? Só sei que tem feito mal. Muito e mau-feito.
Oficialmente, o nome do educador teria sido preterido ao do caçador de esmeraldas e exterminador de indígenas. A estação de Metrô (linha 2, estatizada), ficará, depois de pronta, na Avenida Educador Paulo Freire, nas proximidades da rodovia Fernão Dias.
A estação, que seria nomeada de Paulo Freire, pode até mudar de nome, porque o governador tem a caneta. Mas, você passará, e muito rápido. Será esquecido ou lembrado pela mazelas que tem causado com a política privatizadora e excludente.
Ignorante que é, governador, você está escrevendo uma história baseada em polêmicas, jamais em evidências. Paulo Freire, por outro lado, embora tenha nascido há cem anos, vive em sua obra, em suas memórias, na história que testemunhou, vivenciou e escreveu.
Abaixo, uma matéria de arquivo, que redigi para a celebração do centenário de Paulo Freire: o meu "crush" intelectual, confesso.
Do Brasil para o
mundo: a universalidade do indivíduo
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Eu e o eterno Paulo Freire |
Cada tempo imortaliza um gênio. Hoje, 19 de setembro de 2021,
celebramos os 101 anos do Patrono da Educação Brasileira: Paulo Freire. O brasileiro que ensinou ao mundo que educação requer troca: de experiências, de histórias de vida, de motivação, de metas, de ideias e ideais, de sonhos.
Paulo Freire foi muito além ao criar um método de ensino. Ele
desenvolveu um novo conceito
na práxis pedagógica alicerçada no compartilhar
libertário onde a relação entre professor alunos e colegas se equivalem em
importância e não cabe o individualismo. Aprendizado que nasce da compreensão
do saber com outro, e tem como didática o compartilhamento de experiências.
A prática dialógica, onde a aquisição da leitura e escrita é iniciada
com a compreensão da realidade
individual só é possível devido à participação do grupo. A sala de aula se
transforma em um ambiente multiplicador, facilitando a aprendizagem coletiva.
De fato e direito.
É a chamada leitura do mundo. Saber construído no cotidiano. Onde a
cultura individual é vista como um ativo e é considerada a vivência do grupo.
Afinal, é conversando que a gente se entende, não é mesmo?
O mestre nos ensinou que ninguém aprende sozinho, e que “os homens se
libertam em comunhão”. Uma visão que valoriza o indivíduo ao evidenciar a sua
ação coletiva. Sobretudo, do entendimento sobre a opressão, que é o ponto de
partida para a libertação e a emancipação social. Fundamental no passado e
imprescindível na atualidade.
Ler a obra de Paulo Freire é descobrir um universo cujas ideias provam
que há motivos para acreditar no ser humano. Atemporal, ele emancipou a pessoa
humana ao defender que as respostas estão nelas próprias, mas a construção de
uma sociedade diversa e mais igualitária requer o convívio inerente às relações
interpessoais. Um saber construído a
partir da palavra, do diálogo, da reflexão e, por que não, do empoderamento.
Quando a troca é estimulada por perguntas elas geram respostas. E assim,
quando o diálogo é possível, a reflexão acontece naturalmente. Paulo Freire
encontrou um caminho que leva à compreensão da realidade comum, permitindo
assim a consciência que emancipa e promove projeto a ser conquistado.
Do Brasil para o
mundo
A obra de Paulo Freire é literatura, conteúdo e referência para a
leitura do mundo em todos os tempos e vividos. Principalmente, numa época da
realidade brasileira onde a dualidade de pensamento divide as opiniões e cria
abismos culturais quase intransponíveis para os brasileiros divididos entre as
próprias prioridades, com projetos antagônicos de construção de uma nação. A
polarização que segrega, desconstrói e impede o desenvolvimento coletivo.
Um dos autores mais traduzidos e dentre os homens mais homenageados em
todo o mundo na atualidade, é o terceiro teórico mais citado em trabalhos
acadêmicos da área de Humanas. Paulo Freire acumula mais de 20 títulos
concedidos por instituições de ensino nacionais e internacionais e mais de 30
títulos de Doutor Honoris Causa. Chegou a ser indicado para o Prêmio Nobel pela
importância do conjunto da obra, com mais 20 livros que deixou como legado de
75 anos de vida.
Foi considerado Educador pela Paz, em 1986, pela ONU -Organização das
Nações Unidas- e Educador dos Continentes, pela OEA -Organização dos Estados
Americanos-, em 1992. Em 2012 foi declarado o Patrono da Educação Brasileira (Lei
Federal No 12.612/2012), no governo da presidenta Dilma Rousseff.
O reconhecimento internacional virou marca, contudo Paulo Freire nunca
foi unanimidade no país que nasceu. Foi assim no passado e é agora, no
presente. Mas ele viveu e deixou o seu pensamento para incomodar. Ou melhor,
questionar, a partir do antagonismo e as semelhanças, sempre pensando, como ele
dizia, nos “esfarrapados do mundo”. Um brasileiro que teve a sua liberdade
cerceada ao ser considerado comunista e subversivo no período da ditadura
militar. Contraditoriamente, um homem católico.
Depois de ser preso por 72 dias, foi expulso na condição de exilado
político. Em 1964 foi obrigado a se ausentar do país onde nasceu e amou a vida
inteira, só retornando em 1980, um ano após a Lei da Anistia. Foi obrigado a
deixar o Brasil, mas o Brasil nunca o deixou...
Conheci exilados
assim. Amargurados, tristes, mas fieis ao sonho político por causa do qual
foram desenraizados. Não me lembro de ter conhecido um, sequer, que tivesse se
arrependido da utopia por causa da qual, lutando, terminou no exílio. [1]
Após breve estada na Bolívia, viveu no Chile, Estados Unidos, Suíça e
teve passagens por países da África onde expandiu sua prática, pesquisas e
pensamentos. Trabalhou no Instituto Chileno para Reforma Agrária; foi professor
visitante na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos; consultor do Conselho
Mundial das Igrejas em Genebra, Suíça e um dos fundadores do Instituto de Ação
Cultural, voltado para a educação pela independência. Dentre os inúmeros feitos
levou o método Paulo Freire para a Guiné-BIssau. Ao retornar ao Brasil
estabeleceu-se em São Paulo, onde foi professor da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp), da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e atuou na
construção do Partido dos Trabalhadores.
A memória de Paulo Freire está envolta em fakenews – as chamadas
notícias falsas – além de debates retrógrados, na tentativa de deturpar suas teorias.
Ofensas que remetem aos anos de chumbo da história do Brasil, gerando confusão
de pensamento num momento crucial onde o entendimento das ideias freirianas nos
arma de ideias. Felizmente, os admiradores são em número maior do que seus
desafetos e uma palavra criada por ele, Boniteza, norteia o programa de governo
do Partido dos Trabalhadores, numa justa homenagem ao centenário.
Inspiração para a
vida toda
Conheci Paulo Freire ainda adolescente ao ler “O que é o Método Paulo
Freire”, da coleção “Primeiros Passos”,
editado pela Editora Brasiliense, nos anos 1980. A obra explica, resumidamente,
o que é sistema de ensino a partir das palavras geradoras. Lembro-me de ficar
encantada com o poder delas ao serem extraídas da vivência dos alunos e
catalisadoras da arte das letras. Também, de tê-lo indicado inúmeras vezes,
como facilitador na educação de adultos numa opção às tradicionais cartilhas.
Anos mais tarde, tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente. Ele
estava prestes a assumir o cargo de Secretário Municipal de Educação do governo
popular do PT, na gestão da prefeita Luiza Erundina. Assumiu em 1989, mas
deixou o cargo em 1991. A mídia hegemônica e os desafetos tentaram podar as
asas do professor/secretário, que deixou um legado invejável de realizações,
enquanto gestor. Eu o visitei em seu apartamento, em São Paulo, após
agendamento com a sua primeira esposa, Elsa.
Como eu gostaria de voltar no tempo e poder reviver esse momento! Como
deve ter tido paciência o professor ao dialogar com a jornalista inexperiente
de então… Dizer como ele se tornou importante para a minha vida pessoal e
profissional.
Na época, São Paulo teve a oportunidade de pensar um novo modelo de
educação, idealizada por um advogado em primeira formação, mas que se tornou o
mais importante professor do Brasil. A capital paulista deixou de retomar a
história de luta pela alfabetização que foi interrompida pela ditadura militar.
A experiência que ficou conhecida como
“Quarenta Horas de Angicos”, e que permitiu aos trabalhadores do corte de
cana-de-açúcar, no Rio Grande do Norte a lerem e escrever.
Historicamente falando, foi quando a educação freiriana ganhou corpo. A
aplicação do projeto-piloto reuniu 380 trabalhadores da base da pirâmide
social. Era o ano de 1963 e às 40 horas-aulas foram divididas em 45 dias. A
última delas, ministrada no dia dois de abril, foi assistida por ninguém menos
do que o Presidente da República na época, João Goulart. Ele testemunhou o
desenvolvimento dos alunos, inclusive que escreveram e leram o discurso de
formatura.
Não havia material didático pronto. Tudo foi construído coletivamente. A
realidade do lugar foi pesquisada pelos professores, estudantes universitários
que doaram o seu trabalho voluntariamente durante as férias escolares por
acreditar no projeto. Foram selecionadas 410 palavras geradoras, extraídas a
partir da rotina dos alunos, respeitando a cultura do lugar e dos então
analfabetos. As aulas baseavam-se em conversas que norteavam discussão sobre a
vida, o trabalho e a sociedade. De uma palavras surgiam outras, que tinham a
mesma raiz ou sentido, aumentando o universo vocabular e a compreensão da
escrita.
O “Método Paulo Freire” divide-se em investigar, tematizar e
problematizar, em sala de aula. Através do vocabulário, o professor conduz o
trabalho, relacionando o contexto ortográfico e realidade. O professor é
o facilitador, mas os alunos os protagonistas. Dinâmica que gerava a
politização e o pleno exercício da cidadania a partir da circularidade do
pensar.
A vivência em Angicos serviria de modelo para um novo Programa Nacional
de Alfabetização, que seria aplicado a partir de 1964. A experiência iria ser
multiplicada em todo o país, beneficiando cinco milhões de adultos. Pelo menos,
era a intenção do governo de então. Mas a conscientização dos trabalhadores
levou a uma greve, que desagradou aos senhores de engenho.
A pedra no meio do caminho foi lançada no dia dois de abril de 1964.
Toda a equipe foi presa e os alunos, com medo da repressão, queimaram todo o
material produzido. Paulo Freire foi banido de sua Pátria. Mas quem consegue
apagar a história? O professor ganhou o mundo, assim como o seu respeito.
Retorno ao país
natal
De volta ao Brasil, Paulo Freire trouxe na bagagem o convívio com
diferentes realidades e culturas. O que além de expandir o seu pensamento de
cidadão e intelectual o fez compreender ainda mais a realidade brasileira. Para
ele, cultura não se discute, mas se aceita.
O livro “A Sombra desta Mangueira”, publicado em 1985 e reeditado em
edição comemorativa em 2013 (com revisão e notas de sua segunda esposa, Ana
Maria Araújo Freire) permite-nos conhecer um pouco mais o cidadão e ser humano
Paulo Freire. O livro atualiza o principal reconhecimento ao trabalho do
intelectual.
Um homem de fé, que chegou a passar necessidades e apenas não passou
fome, segundo ele, devido às frutas de época, fartas na sua infância, Paulo
Reglus Neves Freire nasceu em 19 de setembro do ano de 1921, na cidade Recife,
Pernambuco. Um menino que fez do próprio quintal um templo de contemplação, e
que influenciou os pensares do mundo a partir do adulto que se transformou.
Reproduzo aqui as palavras do professor Paulo Freire, no livro, e que evidencia
a sua escolha de vida pela promoção da emancipação política, social e econômica
e cultural da pessoa humana:
A paixão com que
conheço e com que falo ou escrevo não diminuem em nada o compromisso com que
denunciou ou anuncio. Eu sou uma inteireza e não uma dicotomia.
Ele denuncia:
A minha terra é dor
de milhões, é fome, é miséria, é esperança também de milhões igualmente
famintos de justiça, porque a Terra da gente envolve também o processo de luta
por sonhos diferentes, às vezes antagônicos, como os de suas classes sociais.
Mas a vida é assim mesmo. O diálogo, defendido à exaustão por Paulo
Freire, nos faz avançar, regredir, progredir e insistir. Lições para toda a
vida, gerações após gerações. Uma luta diária para não permitir ao dominador o
direito de esmagar o dominado. Sobretudo, na prática da política que de quando
em quando se aplica como acontece nesse início dos anos 2020, de combater a
despolitização da educação.
Pois, não podemos nos esquecer:
Educação precisa
tanto da formação técnica, científica, profissional quando do sonho e da utopia.
O que, para Paulo Freire, não é possível em “aliança com a direita”.
Saberes múltiplos e
diversificados
Seus livros nos apontam o desenvolvimento dos saberes freirianos a
partir das vivências e acúmulo de experiências trocadas. A partir da escrita e
publicação, em ordem cronológica, a obra de Paulo Freire descortina o universo
cidadão relacionado à construção do saber. Leitura que não envelheceu com o
tempo, e sim nos estimula e gera uma vontade de aprender e ensinar, tocar e
trocar. Eles nos sinalizam caminhos de construção.
A tese apresentada para o concurso da cadeira de História e Filosofia da
Educação da Escola de Belas Artes de Pernambuco, em 1959, já sinalizava quem
seria Paulo Freire. Educação e Atualidade Brasileira critica a prática da
educação bancária e lança as sementes da educação como ferramenta de mudança na
busca da promoção do indivíduo e sociedade. Já a Propósito de uma
Administração, de 1961, reavalia ações dos tempos que o autor participava da
administração da Universidade do Recife (atualmente Universidade Federal de
Pernambuco). Dois anos depois, em Conscientização e alfabetização: uma nova
visão do processo, ele defende a sua visão sobre a educação libertadora e
conscientizadora como alternativa aos métodos tradicionais de ensino.
Na condição de exilado político, em 1967, pela prática da educação
dialógica, escreveu, em terras chilenas, Educação como Prática da Liberdade. Um
ano depois lança Pedagogia do Oprimido, a obra-prima onde defende a práxis
pedagógica e repudia a doutrinação. Livro que se tornou referência mundial.
Em Ação Cultural para a Prática da Liberdade e Outros Escritos, de 1970,
avalia a realidade brasileira a partir de seu olhar crítico. A leitura de
Cartas à Guiné-Bissau, de 1978, nos leva a conhecer a internacionalização da
experiência da aplicação da metodologia de ensino criada por Paulo Freire. A
partir da experiência na África, e através da troca de correspondência, em 17
cartas, é possível ler detalhes da experiência no diálogo entre o autor e seu
interlocutor, Mário Cabral, na época Comissário de Educação e Cultura de
Guiné-Bissau.
Na obra Os cristãos e a libertação dos oprimidos, de 1978, Paulo Freire
aborda a questão da liberdade religiosa, tão debatida nos dias de hoje com os
avanços da intolerância. Nascido em família de fé diversa, ele aponta como a
formação religiosa que recebeu, no seio da própria família, foi o ponto de
partida para, mais tarde, como educador, refletir sobre suas ideias e a forma
como se relacionou com a diversidade humana. Ironia do destino ele ter sido
banido do Brasil com a alcunha de comunista, não é mesmo?
Em 1979 analisa, em Extensão e Comunicação, a informação em meio à
sociedade agrária a partir da realidade tão distinta como as vivências dos
técnicos e os camponeses se comparado ao professor e o aluno. Já a
universalização da experiência de Angicos, provando que o modelo criado no
Brasil pode ser replicado em qualquer realidade, é retomada em A Importância do
Ato de Ler em Três Artigos que se Completam, relatando, em 1982, detalhes da
experiência pedagógica em São Tomé e Príncipe. Educação e Mudança, de 1979,
relata pensares da construção de um novo Brasil que vivenciava o início da
abertura política, evidenciando as relações do homem frente à realidade. Ao
longo de toda a sua obra, Paulo Freire sempre retoma a importância da leitura
na alfabetização de adultos.
A questão dialógica reaparece em Por uma Pedagogia da Pergunta, escrita
em forma de conversa com o filósofo chileno Antonio Faundez, em 1985. Através
do compartilhamento de experiências, eles defendem a prática do “repensar
constante”. Uma temática que Paulo Freire retoma em Pedagogia da Esperança, de
1982, que é uma releitura em forma de atualização do que foi abordado em
Pedagogia do Oprimido. Uma espécie de reaprendizado analítico de trinta anos de
construção de ideias e trabalho realizado.
Paulo Freire sempre foi generoso na troca dialógica com os co-autores,
companheiros de jornada que encontrou pelo caminho da vida. Muitas respostas
sobre a evolução da educação do Brasil estão, por exemplo, em Pedagogia: Diálogo
e Conflito, de 1985, escrito em parceria com de Moacir Gadotti e Sergio
Guimarães. Em 1986, o interlocutor é o professor norte-americano Ira
Shor, que divide com ele a autoria do livro Ousadia – O Cotidiano do Professor.
Publicado pela Unicef, em 1989, Educadores de Rua, uma Abordagem Crítica –
Alternativas de Atendimento aos Meninos de Rua aborda a essencialidade do papel
da educação para àqueles que vivem à margem, em meio à pobreza e excluídos na
sociedade e sala de aula.
Sempre instigante e contestador, Paulo Freire analisou, em 1992, um modismo
da época na obra Professor Sim. Tia Não: Carta a Quem Ousa Ensinar, valorizando
e estimulando o profissional de ensino. Em 1993, em Política e Educação,
reflete sobre as verdades da classe dominante e o cansaço existencial enquanto
na coletânea de 11 textos, Que fazer – Teoria e prática em educação Popular, ele
dialoga com o jornalista Adriano Nogueira sobre o papel da educação para a
transformação social.
Uma espécie de livro de memórias, Cartas à Cristina – Reflexões sobre
Minha Vida e Minha Práxis, de 1994, fala de si próprio como pensador e no
mundo. Em À Sombra Desta Mangueira, escrito em 1995, ele atualiza as suas
reflexões e faz crítica à política neoliberal e retoma a questão ideológica. O
livro foi reeditado para celebrar o título de Patrono da Educação Brasileira. Em
1996 lançou Pedagogia da Autonomia, última obra escrita integralmente por ele,
onde traz novas propostas, alicerçadas para a universalidade ética. Um ano
depois, pouco antes de sua morte, acompanhou a elaboração de Pedagogia da Indignação,
de autoria de sua esposa, Ana Maria, a partir de cartas escritas.
Atemporalidade
Seja a partir de suas ideias pessoais, da sua experiência de cidadão,
professor e pesquisador, ou resultado da convivência com os alunos e outros
autores, Paulo Freire escreveu sobre um tema comum, sempre expandindo as
abordagens e estimulando os seus leitores. Não escreveu para a academia, mas
para a sociedade. A partir dos títulos de seus livros podemos acompanhar a
evolução e a maturidade de um homem que viveu além de seu tempo, e cujo saber
não se esgotará nunca, pois pode ser aplicada a realidade atual vivida, acompanhando
os novos rumos da sociedade.
O pensamento de Paulo Freire reflete o agora, a partir do passado
aprendido em lições de vida, mas
vislumbram um futuro a ser construído. E como o futuro será sempre amanhã, o
pensamento não envelhece e o método de ensino podem ser adaptadas e praticadas com
o passar do tempo.
Boniteza – uma
sociedade e construção
O livro A palavra boniteza na leitura de mundo de Paulo Freire foi organizado
pela segunda esposa, Ana Maria, que reuniu amigos intelectuais para falar sobre
o conceito cunhado por Paulo Freire. Inicialmente, a palavra buscava contextualizar
o que o professor pensava sobre o amor na maturidade, porém o novo vocabulário se
expandiu para uma visão de mundo. Junto com “esperançar”, a palavra da vez e
política brasileira nos faz pensar e praticar dias melhores no Brasil.
Paulo Freire, na velhice, retomou uma promessa feita à sobrinha, para
quem não escreveu no exílio. Universitária, ela queria entender o contexto
brasileiro e as razões porque o tio havia deixado o Brasil. Mais tarde, ele
materializou a dívida em livro, Cartas a Cristina, onde ele reafirma que “a
pessoa conscientizada tem uma compreensão diferente da história e de seu papel
nela. Recusa a acomodar-se e mobiliza-se, organiza-se para mudar o mundo”.
Vivo, ele não mudou o mundo, mas continua mudando as pessoas que leem
os seus livros e se identificam com a sua história de vida. Pois, é impossível
continuar sendo o mesmo indivíduo de antes após ler o professor amoroso, que
viveu movido pela esperança e sempre lutou por um mundo melhor. Mesmo quando
teve de esperar, agiu…
Para perpetuar a indagação, a esperança na transformação, Paulo Freire
ajudou a criar, em 1981, seis anos antes da sua morte, o Instituto que leva o
seu nome. Como está publicado no site do Instituto Paulo Freire, ele desejava
“reunir pessoas e instituições que, movidas pelos mesmos sonhos de uma educação
humanizadora e transformadora, pudessem aprofundar suas reflexões, melhorar
suas práticas e se fortalecer na luta pela construção de “um outro mundo
possível”.
O IPT é mantenedor da Editora e Livraria do Instituto, além da Universitas
Paulo Freire, o Centro de Referência Paulo Freire e a Casa da Cidadania
Plenetária. O IPT reafirma, fortalece e reinventa o legado do mestre.
Paulo Freire divulgou o nome do Brasil como poucos intelectuais o
fizeram. Ele amou o país como poucos cidadãos brasileiros souberam amar, mas
nem por isso deixou de criticar, de fomentar a mudança, de gerar a
conscientização. Por isso, foi banido no passado, recebido de volta de braços
abertos e agora tem novamente a sua memória insultada.
O que temem os que menosprezam os saberes de Paulo Freire? Aqueles que
não aprenderam as suas lições? O atual governo não honra o Patrono da Educação
Brasileira e passa o vexame internacional de ser proibido pela Justiça de
praticar atos institucionais contra a sua memória.
Se o analfabetismo persiste no Brasil é porque as escolhas políticas da
classe dominante insistem na exclusão social. A ausência de educação formal e
emancipadora perpetuam o abismo cultural, econômico e política que interessa a
alguns em detrimento de poucos. Paulo Freire disse, em vida, que “gostaria de
ser lembrado como um sujeito que amou profundamente o mundo e as pessoas, os
bichos, as árvores, as águas e as vidas”. Um sujeito que pregava a
sustentabilidade muito antes de o neoliberalismo preterir os homens.
O legado de Paulo Freire move gerações, pois ideias não morrem jamais.
Paulo Freire vive em sua obra. Paulo Freire vive em cada um dos seus
leitores. Paulo Freire vive em mim. Viva Paulo Freire!
(19/10/1921 – 2/5/1997)
[1] A Sombra Desta Mangueira
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, atropela o bom-senso e mostra para o que veio. Herdeiro da política que assolou São Pauloignorância daquele que o criou: o ex-presidente Jair Bolsonaro.
A mudança do nome da estação do metrô da cidade de São Paulo remontaria à ignorância ou o prefeito de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos)